Sônia Sant’Anna relembra a avó Rosentina de Santana e Silva “Dona Iaiá”
Minha avó Iaiá, mãe de meu pai, era extremamente religiosa. Católica fervorosa, praticava ao pé da letra o “não julgueis para não serdes julgados”. Se era severa e exigente consigo mesma em relação à observação dos mandamentos, era misericordiosa para com os que não agiam como ela. Só a Deus competia julgar, dizia.
Morava em Goiás, na cidade de Catalão, à época com cerca de 5 ou 6 mil habitantes. Quem conhece a fundo essas cidadezinhas sabe como seus moradores são impiedosos com os pecadores, sobretudo as pecadoras.
Pois havia em Catalão uma senhora que todos diziam trair o marido, que costumava viajar com frequência a negócios. Na ausência dele, muitos, ao passarem sob a janela da referida senhora, diziam piadas ofensivas em voz alta, cantavam músicas satíricas. Os filhos do casal eram discriminados.
Um dia estavam algumas “mulheres direitas” no armarinho fazendo compras quando entrou a suposta adúltera, e todas lhe deram as costas, fazendo comentários irônicos e maldosos. Pouco depois entrou vovó, a mulher mais respeitada da cidade, a professora que alfabetizou gerações e gerações de catalanos.
Percebendo a cena, mesmo não sendo sua amiga e desaprovando-lhe no íntimo a conduta, aproximou-se efusivamente da que era publicamente humilhada: “Bom dia, dona Fulana, faz muito tempo que não a vejo”. Terminada sua compra, pegou-a pelo braço e, em voz alta, convidou-a para ir a sua casa provar um bolo que tinha acabado de fazer. A seguir estendeu o convite às demais, que não souberam recusar.
Desse dia em diante deram sossego à mulher.
Texto de Sônia Sant’Anna.
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