Reinado, General, Capitães, Dançadores e outros personagens da Congada por Cairo Mohamad Ibrahim Katrib

O Reinado de Nossa Senhora do Rosário atualmente funciona apenas como alegoria no contexto da dramatização que envolve o ritual da Congada em Catalão-GO. Contudo, segue algumas tradições centenárias, mesmo não se sabendo ao certo em que data este se integra as comemorações locais. Segundo a tradição oral, a Família Real está presente nas comemorações desde que a festa começou. Muitos folcloristas como Câmara Cascudo, Saul Martins e Melo Moraes Filho, entre tantos, afirmam que o reinado está ligado a coroação de Chico Rei e sua Corte negra, representantes oficiais dos festejos e da devoção negra a santos como Nossa Senhora do Rosário e Santa Efigênia.

Segundo dançadores antigos dos ternos de Moçambiques como o senhor Geraldo Dias, o Reinado tinha, conforme ouvia contar dos dançadores mais antigos, um poder de decisão muito grande, muito maior do que o atribuído hoje à Irmandade e com o passar dos anos muitas mudanças ocorreram na festa. Os componentes do Reinado mais antigo ou morreram ou abandonaram a Congada e, com isso, todo o poder de decisão passou a ser centralizado nas mãos da irmandade e a partir da criação do Estatuto no ano de 1979, nas mãos da Diretoria da irmandade. Esta, inclusive, reorganizou as vestimentas dos ternos de Congo, fato que pode ser presenciado em descrição de uma Ata de reunião da Irmandade que estabelece que os ternos de Congo usariam roupa branca com faixa vermelha e os Moçambiques roupa branca com faixa rosa.

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Em Catalão-GO, enquanto os festeiros são coroados como anfitriões da festa, representando a participação da sociedade nos festejos de negros, o reinado representa a coroação dos Reis do Congo e a atualização da cultura negra nas festividades católicas da cultura popular, mantendo uma separação de campo de atuação entre brancos e negros. O Reinado integra os ternos de Moçambiques que lendariamente conseguiram retirar Nossa Senhora de uma gruta e conduzi-la ao alto de um morro, onde construíram uma igreja em sua homenagem e, por isso, têm a responsabilidade de conduzir a coroa – símbolo máximo da festa em todos os rituais. Ao lado deste símbolo se enquadra a Família Real que significa muito mais do que a coroação dos reis negros no Brasil podendo ser vista como representação da cultura negra expressa através da fé e da devoção dos negros a Santa protetora, sincreticamente revertida de Iemanjá em Nossa Senhora, mas mantida como tradição viva nas bandeiras dos ternos de Congos.

Esse reinado representa um rito que se define pelo conjunto de personagens coroadas que nos dias de festa recebem homenagens dos grupos rituais; sendo conduzidas em cortejo. Em Catalão-GO não existem registros oficiais que comprovem se realmente essa tradição foi perpétua passada de geração para geração, quando os membros com grau de parentesco tenham se revezado nos cargos que compõem esse rito. Conforme descrições em atas da irmandade, existem registros da morte de um rei da Irmandade e da destituição de sua rainha que abandona a festa por motivo de mudança, sendo nomeada para o posto de rainha a esposa do Rei da época.

Atualmente a Família Real em Catalão-GO, representa uma corte  formada por negros. O Reinado é conduzido por um dos ternos de Moçambique da cidade vão à frente da Família Real prestando-lhe proteção. As figuras do rei e rainha vão sempre à frente do séquito e usam roupas brancas, capa azul ou rosa com estrelas e detalhes dourados e em suas cabeças réplicas de coroas feitas de latão, representando o poder simbólico dado aos negros durante a festa. Os príncipes e princesas usam roupas brancas e capas vermelhas. As mulheres portam tiaras que simbolizam uma pequena coroa e os homens chapéus de palha enfeitados com miçangas e outros adereços. Em qualquer um dos cortejos com a presença oficial de festeiros e Reinado, os festeiros vêm sempre à frente do Reinado, quando a festeira carrega em suas mãos a coroa da festa, que também caracteriza a outorga da irmandade em tê-los anfitriões e responsáveis pela parte social das comemorações.

É tradição que a família Real tenha um tratamento diferenciado dos demais componentes do cortejo por parte dos festeiros. Inclusive durante as refeições todos os membros do Reinado se acomodam numa mesa que é posta em separado com comidas que lembram os banquetes oferecidos aos orixás, seguindo a tradição da realeza como também os ritos ancestrais.

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Faz parte do Reinado a figura do General da Congada.  Suas atribuições são a de manter a ordem o e bom andamento das comemorações em louvor a Nossa Senhora do Rosário. É responsável por todos os cortejos que envolvem a Congada. É o representante máximo dos dançadores, que lhe devem respeito e obediência.

Já existiram casos na Irmandade, de dançadores e capitães serem punidos e destituídos de suas funções por desrespeitar as ordens do General. A escolha do substituto ou suplente de general, geralmente, é feita em vida pelo General atual que escolhe entre os seus capitães aquele que tem maior capacidade de liderança e, ao contrário do Reinado, essa função não é transmitida de pai para filho.

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FOTO: General da Festa do Rosário do Catalão na década de 1990 – João Claudio

Os Capitães,  geralmente em número hierárquico de dois ou três por terno ( 1º, 2º e 3º capitães)  são responsáveis diretos pelo terno e pela conduta dos dançadores, devendo manter a disciplina, a ordem, a organização incentivando o culto a Nossa Senhora do Rosário através das rezas, cantos, dança e batuque. Nem sempre o fundador do terno é também seu capitão.

São escolhidos capitães, os dançadores mais habilidosos e que demonstram iniciativa, humildade, respeito e devoção aos irmãos de farda e a Nossa Senhora do Rosário. Em alguns casos, quando no terno não se tem nenhum dançador com estas características, são os filhos, netos ou algum parente próximo que assume o comando do terno. Essa escolha fica a cargo dos membros do terno com o aval da Diretoria da Irmandade.


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FOTO: Capitães do Terno Pio Gomes: João Coelho, Osvaldo Rodrigues (Sapo) e Antônio Adão.

 

Os dançadores são moradores do bairro ou de bairros adjacentes. Em cada terno existem os dançadores de guia que são aqueles mais experientes que vão à frente do terno comandando as fileiras, temos os dançadores ou soldados que são todos os componentes masculinos de um terno de Congo, inclusive as crianças que vão ao final de cada fila, sempre sob a responsabilidade do 2º ou 3º capitão ou de um dançador nomeado pelo capitão do terno.

Todo terno possui também as bandeirinhas que são moças ou meninas que conduzem a bandeira do terno e são responsáveis pela apresentação do grupo pelas ruas da cidade. Elas se vestem com roupas que acompanham a tonalidade padrão do terno. Cada terno possui entre um a quatro estandartes aos quais são anexados uma grande quantidade de fitas multicoloridas que permitem a inserção de um número significativo de meninas e moças nessa função.

dsc_0397Em alguns ternos temos também as juizas, senhoras mais idosas que saem a frente do terno vestidas de branco, cor que simboliza a pureza carnal ou religiosa. A maioria delas se vestem com vestidos de noivas. Pode-se dizer que apresentam apenas, um caráter figurativo, ao contrário das antigas juizas que tinham anteriormente, a função de recolher mensalidades. Encaminhando-as à irmandade.

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FOTO: A Imagem de uma máquina fotográfica mostra a juíza do Terno de Congo Marinheiro

Atualmente, notamos mais um personagem feminino no universo da Congada, o das organizadoras das bandeirinhas, uma espécie de capitão feminino cujo cargo tem sido ocupado por uma filha, esposa, neta ou por alguém que tenha vínculo com o terno ou com o capitão.  É uma função que tem tido de importância considerável no terno, principalmente nos que possuem mais de 100 componentes, pois quase a metade destes são de bandeirinhas, podendo se dizer que formaria em cada terno um outro terno de bandeirinhas. Daí a necessidade em organizar estas meninas ou moças que vão apresentar os ternos pelas ruas da cidade, necessitando de um suporte quanto ao alinhamento, organização do fardamento e da postura das mesmas durante a execução das coreografias durante os dias oficiais das comemorações em louvor a Virgem do Rosário.

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FOTO: A Imagem de uma máquina fotográfica mostra a organizadora das bandeirinhas do Terno de Congo Caixa Preta

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FOTO: Reinado da Festa do Rosário do Catalão 2008

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FOTO: Reinado da Festa do Rosário do Catalão 2008

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FOTO: Reinado da Festa do Rosário do Catalão 2008 – Rei Eurípedes e a Rainha Eloene

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FOTO: Reinado da Festa do Rosário do Catalão 2008

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FOTO: Reinado da Festa do Rosário do Catalão 1985

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FOTO: General da Festa do Rosário do Catalão 2009 – Dimiro

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FOTO: General da Festa do Rosário do Catalão 2009 – Dimiro

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FOTO: General da Festa do Rosário do Catalão década de 80

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FOTO: General da Festa do Rosário do Catalão 2015 – Eduardo Camilo

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FOTO: General Eduardo Camilo encerra a 138ª Festa do Rosário do Catalão

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FOTO: General da Festa do Rosário do Catalão na década de 1950 – Eutálio Pereira da Silva

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FOTO: General da Festa do Rosário do Catalão na década de 1940 – Orozimbo Antônio de Macedo

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FOTO: FOTO: Geraldo, Eutálio e Rodolfo

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FOTO: Dançadores de Congo na Festa do Rosário do Catalão 2015

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FOTO: Capitão do Catupé Branco na Festa do Rosário do Catalão de 2015

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FOTO: Bandeirinhas na Festa do Rosário do Catalão de 2014 e o General Eduardo Camilo