Cultura, Identidade e Religiosidade: O Congado da cidade de Ituiutaba – MG por Fernanda Domingos Naves
Após a colonização da África negra, os europeus começaram a criar uma série de estratégias para controlar e manter submisso o povo daquela região. Uma dessas formas foi a catequização dos nativos, que inseriu valores e crenças do catolicismo à cultura dos africanos colonos que passaram a mesclar sua fé e devoção com a lusa. O catolicismo de Portugal forneceu aos negros os elementos europeus de devoção a Nossa Senhora do Rosário. No Brasil, a igreja reforçou esta crença enquanto os negros deram forma ao culto e à festa. No Brasil, os escravos que chegavam recebiam denominações referentes a regiões africanas e/ou portos de embarque, termos estes que não correspondiam às etnias específicas. Assim, as etnias não se reorganizavam internamente como continuidade. Essas etnias diferenciadas agruparam-se na diáspora em função de um patrimônio cultural semelhante (SILVA, 2000). A Congada é um exemplo de tais agrupamentos.
Em Minas Gerais, a festa do Congado surgiu quando um antigo rei africano veio para o Brasil. Segundo a lenda, Francisco (Chico-Rei) era imperador do Congo e veio pro país com outros escravos. Na viagem, ele perdera a mulher e seus filhos, restando apenas um. Intalando-se em Vila Rica, realizou economia e conseguiu comprar sua liberdade e de seu filho. Posteriormente, obteve a alforria de seus súditos e adquiriu a Mina da Escandideira. Chico-Rei casou-se novamente e organizou a Irmandade do Rosário e Santa Efigênia, construindo uma igreja no Alto da Santa Cruz, a igreja de Nossa Senhora dos Rosário dos Pretos. Tempos depois, Chico-Rei e sua rainha, por terem construído a igreja, foram coroados após um cortejo que se seguiu pela cidade, seguidamente eles adentraram a igreja relembrando suas trajetórias cantando, dançando, festejando e louvando a Nossa Senhora do Rosário como forma de agradecimento por ter-lhes concedido a liberdade tão esperada. O uso das linguagens diversificadas como suporte ao oficio do historiador que não possui como fonte de pesquisa apenas os registros escritos, oportuniza reflexões e caminhos instigantes como é o caso da análise do cotidiano. Através dessas narrativas cotidianas que percorrem os caminhos da história e da memória percorre-se também a dinâmica das histórias de vida pelos viesses dos sentimentos e expressões contidas na face dos atores sociais. Foi fazendo o uso dessas linguagens diversificadas que realizei a pesquisa. A pesquisa foi conduzida com base nessas leituras, pois nossa pretensão era conceber com outros olhos aquilo que os olhares comuns percebem apenas como tradição ou folclore, paralisados no tempo e no espaço. Nesse sentido, foi de fundamental importância a discussão sobre Cultura Popular, destacando dela a religiosidade.
DESVELANDO O CONGADO DA CIDADE DE ITUIUTABA-MG
A festa do Congado se edifica num universo imagético muito rico, pois é marcado por momentos festivos e devocionais que se materializam em diferentes tipos de representações e se (re) constroem alicerçados numa ludicidade que procura trazer à tona o passado, construindo um sentido que perpassa a expressividade visual, já que é uma tentativa de manter viva práticas e saberes ancestrais que expressam vínculos de pertença e identidade.
Esse tipo de percurso seguido nos oferece probabilidades interpretativas do cotidiano, permitindo ao historiador compreender a construção de uma história também marcada por caminhos múltiplos do entendimento, uma vez que, o ofício do historiador não deve ser meramente entendido como o de responsável pela escrita de uma “história-verdade”, posto que “as representações se inserem em regimes de verossimilhança e de credibilidade, e não de veracidade” (PESAVENTO, 2001), a recomposição e a tentativa de compreensão das tramas tecidas na efetivação dos festejos, se sustenta nas várias narrativas que se formam ao redor desse mosaico festivo, cujas peças ao mesmo tempo em que se encaixam, deixam fendas a serem desveladas pelo olhar atento do historiador, revigorando possibilidades de compreensão da realidade.
Em Ituiutaba, segundo relatos de alguns congadeiros, os festejos aconteciam em fazendas nos arredores da cidade onde também se criavam os ternos. Com o devir do tempo, a festa tornouse conhecida e foi trazida para a cidade. Contudo, o pároco da época não aceitou que os congadeiros adentrassem na Igreja, proibindo a realização da festa no local. Esta proibição se deu porque os congadeiros, não seguiam a religião católica, mas sim outras de origem africana. Enquanto isso, nos arredores de Ituiutaba, para homenagear sua esposa Geralda Ramos da Silva em seu aniversário no dia 2 de abril de 1951, o senhor Demétrio Silva da Costa (Cizico) convidou seu pai Marciano Silvestre da Costa, seu irmão Geraldo Clarimundo da Costa e vários outros amigos para brincarem de Moçambique e comemorarem a data. Ao saber do ocorrido, Ana Carolina Ribeiro (Dona Rosa), prima de Cizico, convidou o grupo para, juntos, levarem o terno de Moçambique em Ituiutaba e reascender a devoção a São Benedito com muita dança, festa e devoção. Assim, se dirigiram ao pároco da época, o Padre João Ave, para comunicá-lo e pedir-lhe a licença para, junto à igreja, fazerem a festa de São Benedito e Nossa Senhora do Rosário. O pároco, não permitiu, alegando problemas que a Igreja tivera anteriormente com os ternos de Congado que antes existiam em Ituiutaba, e que, em virtude desses atritos, já havia se fragmentado.
Em 1952, o terno recém criado, resolveu ensaiar com o intuito de colocar o grupo devidamente uniformizado na rua em sinal de protesto contra a atitude do padre. Eles desceram a Rua 22 às 5 horas da manhã. Fizeram uma alvorada com fogos na frente do Fórum local conseguindo o consentimento da justiça para realizarem os festejos na cidade. Dirigiram-se para a Igreja Matriz São José, onde adentraram o recinto e assistiram à missa da manhã. Após, os congadeiros saíram em visita a várias residências cantando, dançando os santos protetores pelas ruas. Nos anos seguintes a festa aconteceu sem a existência de uma Irmandade ou apoio da Igreja. Mesmo assim, os congadeiros insistiam em ter o reconhecimento do festejo junto à Igreja, realizando a cada ano os festejos em louvor a São Benedito e Nossa Senhora do Rosário, com o apoio dos devotos e simpatizantes. Anos depois, reestrutura-se o Congado em Ituiutaba. O grupo agora, organizado, trava uma queda de braços com o pároco da Igreja, o qual passa a fazer uma série de exigências a estes para que ele conceda, aos mesmos, espaço no local. Uma dessas exigências foi a de que os congadeiros abraçassem realmente a fé católica. Acatando o pedido do padre eles batizaram, receberam a primeira eucaristia, crismaram e aqueles que eram amasiados, se casaram na Igreja. Outra exigência era a de que os congadeiros tivessem participação ativa nas cerimônias religiosas, só assim, a festa passaria a ter algum vínculo com a Igreja. A Igreja Católica tentava assim, apagar dos negros sua herança religiosa africana; todavia, os congadeiros, apesar de “católicos”, não deixavam de manter suas práticas ancestrais, mesmo que secretamente.
Diante do cumprimento de todas as exigências feitas por ele, Padre João Ave, em 1956, pediu para que os congadeiros, entre si, escolhessem doze casais que conhecessem bem as doutrinas católicas. Desses casais, os homens, nomeados pelo padre como “Os Doze Apóstolos” (Marciano Silvestre da Costa, Geraldo Clarimundo da Costa, Demétrio Silva da Costa – Cizico, Antônio Belchior, Antônio Balduino da Costa – Antônio Cabra, Agenor Prudêncio do Nascimento, Andira Alves, Avelino Máximo da Costa, Jerônimo Ventura Chaves – Dunga, Aristides da Silva, Antônio Edmundo e Senhor Manoel Gomes) fundaram a Irmandade de São Benedito de acordo com as instruções do pároco, que autorizou, no ano de 1957, o funcionamento da Irmandade, responsabilizando-a pelos ternos fundados entre os anos de 1951 a 1954 e pelos demais que supostamente viriam a surgir.
A partir da criação da Irmandade de São Benedito, os grupos de Congado passaram a ter também seu próprio grupo religioso dentro da Igreja, que passa a ter não só função religiosa, mas também cultural, organizando e coordenando os ternos de Congado de Ituiutaba. Conforme consta no Pequeno Histórico da Irmandade de São Benedito, ela foi fundada no dia 13 de Maio de 1957 com “missa especial” e com “primeira comunhão de vários beneditinos jovens, crianças e adultos”. Foi através da criação da Irmandade de São Benedito que os congadeiros ganharam permissão para festejar na Igreja. Foi através dela também que eles levantaram capital para, mais tarde, comprar o terreno e erguer a Igreja de São Benedito.
No início a Irmandade era formada por pouco mais de 100 pessoas, hoje ela é composta por mais de 600 indivíduos. Ela tornouse a garantia dos congadeiros de “direito à Igreja”; sua criação e fundação abriram as portas para a consolidação dos ternos e fez-se alicerce para os que surgiam. A festa em louvor a São Benedito é composta por sete ternos de Congado da cidade e pela participação de vários outros oriundos de cidades circunvizinhas que participam das comemorações há vários anos.
Em cada terno temos uma equipe interna formada por coordenadores, guarda-estandartes, dentre outros que dão suporte ao grupo não só durante os festejos, mas também em qualquer evento ou atividade realizada pelo grupo. Todos os ternos que compõem o Congado são filiados à Irmandade de São Benedito. Os ternos se distinguem pelas cores da farda que, possuem geralmente, as cores da imagem de Nossa Senhora do Rosário que são: azul, branco, rosa, verde e o vermelho; que variam de acordo com o estilo épico das imagens. Em Ituiutaba, as cores agregadas a cada terno dão nome a alguns grupos tradicionais, da mesma forma que outros recebem outras denominações. Fazem parte do Congado de Ituiutaba os seguintes ternos:
I) TERNO DE MOÇAMBIQUE CAMISA ROSA:
A criação desse terno é fruto do esforço do senhor Demétrio Silva da Costa “Seu Cizico” que, para comemorar o aniversário de sua esposa, Dona Geralda, no dia 02 de Abril de 1951, resolveu presenteá-la com uma festa diferente, de Congado. O ápice desta comemoração foi a apresentação de um pequeno grupo de dançadores de Moçambique ensaiados e comandados pelo próprio Cizico. A partir dessa homenagem e naquele mesmo dia o casal, juntamente com o Senhor Marciano Silvestre da Costa e Geraldo Clarimundo da Costa (pai e irmão do Sr, Cizico), com a senhora Anna Carolina Ribeiro (dona Rosa), prima do Senhor Cizico decidiram fundar um terno de Moçambique. No dia 05 de outubro de 1951, o grupo se apresentou pela primeira vez, tendo em sua composição 13 dançadores e 05 bandeirinhas. Segundo relatos da filha do casal Maria Lúcia de Oliveira2 , o terno criado por seu pai, é um dos principais autores do resgate do Congado de Ituiutaba. Durante o “resgate” foram vários os obstáculos enfrentados pelo capitão Cizico que é lembrado por todos, como um grande repentista. Seu Cizico faleceu no dia 28 de julho de 1964 e, em virtude dessa fatalidade, sua viúva assumiu o comando do terno. Preocupada em manter viva a tradição iniciada por seu esposo, Dona Geralda começou a preparar o filho, de apenas 13 anos, para chefiar o terno. No ano de 1978, Mário Afonso da Silva assume o comando do terno permanecendo a sua frente até os dias atuais.
II) TERNO DE CONGO CAMISA VERDE
O Terno de Congo Camisa Verde foi fundado no ano de 1954 por Geraldo Clarimundo da Costa juntamente com sua esposa Dulcinéa Luiz Cassiano, seu irmão Demétrio da Silva Costa e seu pai Marciano Silvestre, com o intuito de abrilhantar os festejos em louvor a São Benedito e a Nossa Senhora do Rosário, iniciados na cidade no ano de 1951 reforçando os vínculos ancestrais da família através da festa. O terno de saiu às ruas da cidade, pela primeira vez, com cerca de 30 pessoas, todas trajando roupas nas cores verde e branca. A maioria, familiares do senhor Geraldo que foi o primeiro capitão do terno e ensinou aos dançadores o ritmo e as coreografias a serem executadas. Geraldo Clarimundo exerceu o cargo de capitão até o ano de 1988 quando veio a falecer. O grupo mantém nas vestimentas as cores que dão nome ao terno: “o Verde que simboliza a esperança e o sentimento de continuidade, o Branco representa a paz que o grupo prega e leva adiante em cada gesto e o Amarelo a riqueza do Brasil” – Divina C. Teles, depoente – . Seus dançadores usam camisas em cetim verde, calça branca, faixa amarela na cintura e chapéu de palha ornado com lantejoula, pedrarias e fitas multicoloridas. Alguns dançadores optam por usar um lenço ou turbante na cabeça, mas não dispensa o uso do chapéu que é um adereço que compõe a vestimenta do dançador.
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III) TERNO DE MOÇAMBIQUE ESTRELA D’ALVA
O terno de Moçambique Estrela D’Alva foi fundado no ano de 1982 por Agnaldo Severino da Silva (já falecido) e sua esposa Maria das Dores Silva (Dona Xuxu). Natural da cidade do Prata. Agnaldo Severino demonstrava sempre ser muito devoto de São Benedito, por isso, conduziu com muita dedicação o terno de Moçambique por vários anos. Ele dizia que as cores do terno estavam relacionadas às cores do manto de Nossa Senhora, também presentes no estandarte do grupo. O fardamento do terno é constituído de calça e camisa brancas com faixas azuis, chapéu de palha coberto em tecido azul. Quando Agnaldo Severino da Silva veio a falecer, em 1988, o terno ficou desativado por três anos, por não haver mais quem o conduzisse. Em 1991, Dona Maria das Dores conseguiu levantar o terno contando com a colaboração de seus familiares (filhas, genros e netos), elegendo como 1º capitão: Maurílio Prudêncio de Souza, que ficou no terno por dois anos, deixando-o em 1994 para assumir o seu terno do qual é um dos fundadores o Moçambique Águia Branca. A Matriarca: Senhora Maria das Dores Silva 87, anos (Dona Xuxu) se encontra acamada há vários anos, mesmo assim se mantém lúcida e traduz com muita clareza a falta que sente de ver o terno novamente participando dos festejos e homenagens em louvor a São Benedito. O terno encontra-se desativado há mais de um ano, o que se torna uma grande preocupação para os antigos integrantes do terno e sua Matriarca, pois, a falta da liderança de um capitão que tenha interesse em reestruturar o grupo pode por um levando adiante a herança cultural da família.
IV) TERNO DE CONGO REAL
O Terno de Congo Real foi fundado no ano de 1987, pelo Sr. João Luiz da Silva (João da Badia) e sua esposa Marina Eurípedes de Oliveira, já falecida. Desde jovem, Sr. João da Badia, participava das festividades do Congado, sendo dançador de um terno de Moçambique. Através dos ensinamentos do Senhor Lazinho Goiano, capitão do terno em que Sr. João dançava, e das conversas informais que teve com o festeiro da época, o senhor Mato Grosso, João percebeu que a possibilidade de materializar o sonho de fundar seu próprio terno não estava tão distante. João Luiz foi se envolvendo com outras manifestações culturais, porém, não se esquecia do desejo que tinha de fundar seu próprio terno de Congo. O fascínio pelo popular envolvera de tal forma João Luiz que ele se tornou dono de um grupo de Folia de Reis e o mantém há 54 anos. Anos após, buscando a realização de seu antigo sonho, ele e seus companheiros de Folia se juntaram com o Congado para louvarem juntos, São Benedito e Nossa Senhora do Rosário. Foi nesse período que, durante uma viagem à cidade de Luz–MG com seu grupo de Folia, ele teve contato com vários outros ternos de Congado e um, em especial, o encantou. Foi deste terno que ele retirou a inspiração para as cores de seu terno. Com apoio do amigo, Geraldo Clarimundo da Costa, o terno foi criado elegendo a cor amarelo ouro como a cor predominante do terno espelhado nas vestimentas usadas pelo terno da cidade de Luz.
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V) TERNO DE MOÇAMBIQUE LUA BRANCA
Criado em maio de 1990 o Terno de Moçambique Lua Branca teve como seus fundadores o senhor Nilo Geraldo da Silva e sua esposa Maria Orminda da Silva, dona Maria Senhora Domingues Martins (D. Senhorinha) e seu filho Cláudio Domingues Martins. Segundo Dona Senhorinha, em 1989 seu filho Cláudio, dançador de Moçambique, se afastara do terno no qual participava. Este, sendo criado no universo das festividades do Congado, pediu à sua mãe que, ara continuar dançando Moçambique, fundasse um terno para que ele pudesse dar continuidade à sua devoção. Dona Senhorinha, apesar de todas as dificuldades pelas quais passava mais que depressa, acatou o pedido de seu filho, desde então, passaram a reviver uma tradição familiar herdada de seu avô paterno, o Senhor Apolinário Martins, oriundo da cidade de São Tomé das Letras-MG, onde já participara de outros ternos de Moçambique. O nome Lua Branca foi escolhido pelo capitão Cláudio Martins, devido à sua grande admiração e fascínio pelo brilho e, principalmente, pelo brilho dos astros, em especial da Lua. Segundo o capitão “o terno de Moçambique Lua Branca nasceu para brilhar”. Os dançadores se vestem com calças e camisa brancas, faixa verde, chapéu ou turbante na cor verde. As bandeirinhas seguem a mesma ordem de cores utilizadas pelos homens, ou seja, blusa e calças brancas com faixa verde em cetim amarrada á cintura e, nos cabelos, adornos na cor verde.
VI) TERNO DE MOÇAMBIQUE ÁGUIA BRANCA
Fundado no ano de 1994, o Terno de Moçambique Águia Branca foi criado através da iniciativa dos irmãos Maurício Prudêncio de Souza (falecido), Maurílio do Nascimento de Souza (Nilo) e Eurípedes Francisco Pereira (Pipa) que, apoiados pela mãe Rosária Esperança de Souza, realizaram um antigo desejo da família. O Terno tem como Conselheiro Fundador o Sr. Agenor Prudêncio do Nascimento que, aos 87 anos, é o único dos 12 apóstolos (ver Irmandade de São Benedito: a realização de um antigo sonho) vivo que atua junto à Irmandade, que é avó dos irmãos citados acima. As cores do terno são azul, branco e rosa, inspiradas nas cores dos ternos que já existiam na cidade. O estandarte é azul e branco. Assim como os demais ternos, o Moçambique Águia Branca é composto, em sua maioria, por pessoas de uma mesma família. Os dançadores usam calças brancas, camisas de cetim em tom azul escuro, faixas cor-de-rosa entrelaçadas ao corpo e chapéus coberto em tecido, ornado em paetês, lantejoulas e marabu. A origem do nome do terno, segundo o 1º capitão Maurílio, está ligada ao Orixá Caboclo Águia Branca.
FONTE: http://pontalemfoco.com.br/veja-os-detalhes-do-tradicional-encontro-de-congos-de-ituiutaba/
VII) TERNO DE CONGO LIBERTAÇÃO
Segundo relatos dos integrantes do grupo composta, praticamente, por integrantes da mesma família, as coisas não iam nada bem pra todos. Havia doenças, pobreza e desavenças entre vários parentes, inclusive entre as irmãs Lázara e Maria Aparecida, que não se falavam há anos. Maria Aparecida e Lázara, por incumbência do destino, se casaram e tiveram seus filhos sendo que, os filhos, tanto de uma como da outra se apaixonassem e, mesmo primos, se casaram. Anos após as duas se viam avós dos mesmos netos, mas ainda não se falavam. Foi então que Maria Aparecida, pautada na religiosidade ancestral, recebeu a orientação dos Guias Espirituais Maria Conga e Preto Velho, intermediados pelas médiuns Cláudia Luiza da Silva (sobrinha de Dona Aparecida) e Leamar Cândido (filha de D. Aparecida) de criar um terno de Congo com o intuito de unir e Libertar sua família de todo o mal que a segue há décadas. Estes Guias Espirituais determinaram todos os passos a serem dados daquele momento em diante, como as cores do terno, escolha dos capitães, e, segundo a família de dona Aparecida, ainda determinam todos os caminhos para a estruturação do terno. Deste momento em diante, toda a família se manteve reunida guiada pelo mesmo ideal, libertar a si e a seus ancestrais, o que os permite manterem-se unidos em torno de um ideal regido pelas forças supremas, pela busca da paz, guiados sempre pela proteção Divina e de seus mentores espirituais. O nome Libertação foi escolhido para representar a libertação dos antepassados de seus pecados, dos trabalhos feitos por terceiros para prejudicá-los. Essa mesma força espiritual determinou as cores do terno, cores essas constituídas a partir da cor símbolo das divindades que regem a família. Escolheram e definiram a composição do grupo. O terno da Libertação é composto por 40 componentes que passam por um intenso aprendizado e só são admitidos no terno depois de ter todo conhecimento da estrutura organizacional do grupo, onde o não cumprimento de normas como: beber trajando o uniforme do terno; tirar o uniforme antes de ser liberado, faltar a três leilões da campanha sem justa causa, é dentre outros os motivos de exclusão do terno. Estes são alguns dados que relatam sobre o andamento da pesquisa apresentada. No emaranhado dos acontecimentos o historiador procura seu ponto de partida como um camponês procura um olho-d’água. Nem sempre é possível saber de onde essa água vem. Mas para poder bebê-la basta ir em busca de onde ela aflora à superfície (SOARES, 2000). No decorrer desta pesquisa busquei ir onde aflora-se os sentimentos e toda a religiosidade que envolve os indivíduos que participam das festividades em louvor a São Benedito, tentando compreender como eles mantêm esses vínculos ancestrais com seus antepassados, notando sempre a preocupação deles em transmitir todos esses conhecimentos às gerações futuras, com o propósito de que estes hábitos e costumes não se percam pelo tempo. Nesse ínterim, pude perceber como eram desenrolados os encontros e desencontros entro os personagens que compõem o cenário festivo, os interesses da projeção política ou social; os gastos com a festa; a quantidade dos gêneros alimentícios utilizados para tornar realidade os cafés e os almoços oferecidos; o montante de dinheiro disponível para montar e ornamentar os ternos, dentre outros. Tomei conhecimento da dificuldade que cada um passa para se manter ali, festejando e louvando. Só mesmo com muito amor e devoção ara conseguir ir a diante.
REFERÊNCIAS:
KATRIB, Cairo Mohamad I. Nos mistérios do Rosário: as múltiplas vivências da festa em louvor a Nossa Senhora do Rosário – Catalão (GO). Uberlândia. Dissertação (Mestrado em História) –. Universidade Federal de Uberlândia, 2004. 244 p. ______. No (des) compasso da festa: o reencontro de muitas histórias. In: História e Perspectivas, nº. 34 – jan.jun. 2006. Uberlândia/MG. Universidade Federal de Uberlândia. Cursos de Graduação e Programa de Pós-Graduação em História.
PESAVENTO, Sandra J. Indagações sobre História Cultural. In: Revista Artcultura. Uberlândia: NEHAC/UFU. Nº. 03, 2001. ______. História e História Cultural. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.
SILVA, J. C. G. 2000. Negros em Uberlândia e a construção da Congada. Um estudo sobre Ritual e Segregação Urbana. Uberlândia, Relatório FAPEMIG.
SOARES, Mariza de Carvalho. Devotos da cor. Identidade étnica, religiosidade e escravidão no Rio de Janeiro, século XV. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000. 232p.