A Catalão, em seu Centenário por Wagner Estelita Campos
Pede-me a GAZETA DO TRIANGULO um artigo, ainda que breve, sobre o centenário de Catalão, melhor dizendo, de sua elevação à categoria de cidade, pois que de existência Catalão já é mais que bicentenária. Mas que dizer a respeito? Recordar tudo que me prende a Catalão, tudo que minha terra natal sacode em meus sentimentos e tudo que para mim significa? Então um simples artigo seria espaço muito pequeno. Pequeno demais para recordar a infância, os amigos de peraltices, tantos já desaparecidos, o colégio dos padres, as festas de São João, o carinho de minha mãe, a ingenuidade com que aos cinco anos, quando me perguntavam o que desejava ser, eu respondia que príncipe ou poeta… E que os banhos no poço do Zé Maria, as primeiras peladas, os deliciosos “canudos” comidos no circo – e que circos! – a primeira representação teatral (eu e o Pedrinho de anjos, o Chiquinho Vitor de São Tarcísio); a sova que levei de meu pai quando fumei o primeiro cigarro, (um “Olga”, que me deixou inteiramente tonto), a cartilha que perdi e inventei que passara para o primeiro livro, as brigas entre os meninos “de baixo” e os meninos “de cima”, a iluminação a carbureto, as lanternas com que se saia à noite, o telefone, de que foram “centristas” o tio Cláudio e o Zoroastro, a chacina dos turmeiros (no dia seguinte a visão dos cadáveres que tanto me impressionaram); o Alfeu me dando 200 réis para fingir que êle sabia hipnotizar (fazendo bonito para as moças), os “vales” que nós arranjávamos para comprar pé de moleque na venda do João Cândido, os carnavais de limão de cheiro e eutrudos, os soldados dando uma salva de tiros em homenagem fúnebre a Isaac da Cunha; os juris em que eu não compreendia com um homem acusado era, no fim tão festejado e tão cumprimentado, o primeiro cinema (uma fita em que o diabo era o principal protagonista), depois os cinemas do Marcílio (fitas de bandido) e do Álvaro (fitas de amor), e em que se molhava o pano antes do espetáculo; as bandas de musica (ah! Os dobrados que me davam vontade de ser herói!), os pitos do padre “velho” (Padre Eustáquio), e do Padre Gabino, a confusa paixão que eu, menino de 7 anos, alimentava pela Davina, já moça e noiva, os foguetes que me encantavam e os tiroteios que me amedrontavam, o dia em que descobri – e com que melancolia! – que o “menino Jesus” (hoje Papai Noel) não existia, pois surpreendi meu pai, na noite de Natal, pé ante pé, a colocar na minha cama uma bola de borracha… E a raiva com que xinguei o dr. Uchôa no dia em que me furou um abcesso na perna! E a minha primeira comunhão, que minha avó, a criatura mais santa e bondosa que já conheci, me obrigou a repetir depois no Rio, porque disse que eu não estava preparado antes. E as lágrimas de minha mãe, na véspera de meu embarque para o Rio, em companhia de meus avós, quando colou seu rosto ao meu e me deu tantos conselhos, com aquela fisionomia suave, aqueles cabelos longos, aquela bondade – recordação que ate hoje me humedece os olhos!
Depois, as ferias de estudante, as primeiras namoradas, os primeiros bailes, as primeiras serenatas, a primeira defesa no júri (num dos quais o réu me disse que era pobre, não podia pagar, mas oferecia os seus “serviços” quando necessários…), o primeiro discurso politico, as partidas de futebol, os pagodes de Ouvidor na pensão do Nhonhô de Melo… Mas fiquemos por aqui porque é óbvio que recordações rapaz não se contam tão facilmente como as recordações da infância…
Hoje a imensa saudade de tudo isso e o desejo que tenho e os votos que faço para que Catalão seja em breve uma grande cidade, próspera, feliz, progressista, tranquila.
De mim, como Catalano, creio que tenho procurado retribuir, em dedicação, tudo que à minha terra natal devo pelo carinho e a solidariedade de meus conterrâneos. Aí estão as obras de Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo, aí está surgindo a Santa Casa, que será um dos melhores hospitais regionais do Estado, e principalmente, aí estão as máquinas rasgando a BR 106 e a ponte sobre o Rio Paranaíba.
E – coincidência feliz! – na semana em que redijo êste artigo deverá ser sancionada pelo presidente da Republica a Lei de minha autoria que inclui a Rodovia Limeira – Brasília, passando por Catalão, no Plano Rodoviário Nacional e concede, durante cinco exercícios consecutivos, para essa estrada, 200 milhões de cruzeiros, no total de um bilhão!
Minha maior alegria, portanto, no centenário de Catalão, é a de haver contribuído para que as festividades respectivas sejam comemoradas com a Vigência daquela Lei, instrumento de redenção econômica de meu querido torrão natal, até aqui injustamente bloqueado das grandes vias de transporte, o que tanto vinha sacrificando e estiolando as atividades fundamentais de sua agricultura, de sua pecuária, do seu comercio, de sua indústria e até de sua vida social.
De outro lado – e com que satisfação o faço! – posso comparecer às festas do centenário de Catalão, dizendo a meu velho pai, o grande interprete do sentimento artístico de nossa cidade, que procurei honrar o seu nobre exemplo de honradez e independência, conquistando um patrimônio moral que me compensa , de sobejo, a escassez do patrimônio material.
Saúdo, portanto, Catalão, com o melhor de meu afeto e estou certo de que ela será, dentro de poucos anos, uma grande, bela e altiva cidade, orgulho de todos os seus filhos.
(Wagner Estelita Campos – Jornal “Gazeta do Triangulo”, Caderno Especial –
“Salve o Centenário de Catalão” – Araguari, Minas Gerais, quinta-feira, 20 de agosto de 1959)
Wagner Estelita Campos, filho de Frederico Campos e Julieta Prates Campos, nasceu em Catalão, Goiás no dia 5 de janeiro de 1910. Realizou seus estudos secundários na Escola Carmelitana Santo Alberto, em Goiás Velho — então capital do estado de Goiás —, e no Colégio Salesiano Santa Rosa, em Niterói, então capital do estado do Rio de Janeiro.
– Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade do Rio de Janeiro;
– Redator chefe da Revista “A Época”, da Faculdade de Direito, eleito pelos respectivos alunos em 1930;
– Delegado-Geral de Polícia, GO, novembro de 1931 a outubro de 1932;
– Técnico de Administração, DASP, 1940-1964, através de concurso que obteve o 1º lugar, em 1939;
– Cursos especializados na American University, de Washington, D.C. e estágios em diversas repartições americanas (1941 – 1942);
– Chefe de Seção e depois diretor de divisão do DASP (1943 -1950);
– Secretario Geral de Administração da Prefeitura do D.F. (1951- 1952);
– Chefe de Divisão do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (1953 – 1954);
– Eleito em outubro de 1954, Deputado Federal pelo Estado de Goiás para o período de 1955 – 1958;
– Eleito para presidente da Comissão de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados (1957);
– Reeleito unânimente presidente da Comissão de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados (1958);
– Reeleito em outubro de 1958, Deputado Federal para a legislatura 1959 – 1962;
– Reeleito unânimente presidente da Comissão de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados (1959);
Filiações Partidárias: PSR, 1934-; PSD, 1954-; PDC, 1961-. 1930;
– Professor dos cursos de Administração do DASP, de 1943 a 1953;
– Professor de Direito Administrativo na Faculdade de Economia da Associação Cristã de Moços (1950 – 1953);
– Professor de Direito Administrativo na Escola Brasileira de Administração Publica (1952 – 1959);
– Participou do X Congresso Internacional de Ciência Administrativa, em Madri, no ano de 1956.
– Diversos cursos e conferencias na ACEMAR (Escola de Comando e Estado Maior da Aeronáutica); Escola de Estado Maior do Exercito; Escola Superior de Guerra; Academia Militar de Agulhas Negras; Diretoria de Intendência Marinha; IAPI; Departamento do Serviço Publico do Estado do Rio; Faculdade de Economia da Universidade de Porto Alegre, além de outros em Belo Horizonte, São Paulo e Goiânia; Premio IDORT de 1952, concedido ao autor que mais se destacou pela divulgação de obras sobre administração publica;
– Recebeu, em 1954, dos alunos da AMAN (Academia Militar de Agulhas Negras), a miniatura da Espada de Caxias;
– Condecorado em 1959, com a Medalha de Tamandaré;
– Participou das seguintes missões oficiais: Representante da CD no XI Congresso do Instituto Internacional de Ciência Administrativa, 1959; Jogos Luso-brasileiros, Lisboa, 1959; Jogos Olímpicos, Roma, 1959; viagem aos EUA a convite do governo daquele país, 1962.
– Diretor Administrativo, Superintendência de Serviços Médicos, Suseme, 1963;
– Diretor-Geral, DASP, 1964;
– Ministro do TCU, 1964-1979;
– Presidente do TCU, 1968-1976.
– Concluído o mandato na presidência, continuou ministro do tribunal até sua morte.
– Foi casado com Áurea Fraga de Campos, com quem teve dois filhos.
– Faleceu em Brasília no dia 13 de setembro de 1979.
Obras Publicadas: Chefia, sua Técnica, seus Problemas, Rio, 1947, traduzido para o castelhano pela Editorial Bibliográfica Argentina, de Buenos Aires, em 1950; Problemas de Chefia e Administração, Rio, 1950; Administración de Empresas, Argentina, 1952; Curso de Jefatura Administrativa, Costa Rica, 1955.
FOTO: http://portal.tcu.gov.br/data/files/83/60/01/12/665C5510E8772C551A2818A8/IMG_6666%20copy.jpg
FOTO: Segundo Sylvio Netto Lorenzi do http://nossocatalao.blogspot.com.br/ “Em primeiro plano,Nilo Margon. O senhor calvo é o governador do estado, José Feliciano Ferreira; Deputado Federal Wagner Estelita Campos; prefeito de Catalão Ozark Leite; Antônio Aires”. http://nossocatalao.blogspot.com.br/2011_10_01_archive.html
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